Há alguns meses ouvi, na coluna "Dentro do Espelho" apresentada pela jornalista Inês de Castro na Band News FM, uma crítica ao atendimento eletrônico (que os mais familiarizados com o mundo das telecomunicações e contact centers conhecem como URA - Unidade de Resposta Audível, ou ainda como IVR - Interactive Voice Response).
Já ouvi e li diversas criticas sobre as soluções de URA, mas o que me chamou a atenção desta vez foi a argumentação de que, em muitos casos, as soluções estariam subestimando os usuários e se tornando "infantilizadas" no que se refere aos artifícios utilizados para parecerem mais humanizadas.
A jornalista fez menção, inclusive, ao atendente virtual informar um nome próprio, aos já famosos áudios de teclado de computador (que simulam um operador digitando), ao uso de gírias e ao uso incorreto da Língua Portuguesa como recursos que tentam transmitir a impressão de modernidade e de ligação com o público mais jovem, mas que acabam apenas irritando o usuário que, por sua vez, sente-se subestimado.
Além da coluna já citada, recentemente li um artigo chamado "Interactive Voice Response Systems and Other Inhuman Monsters" (escrito pelo consultor norte-americano Doug Tanoury). No artigo, o autor aborda a genialidade na ideia de se automatizar diversos processos de atendimento (ou até mesmo de se automatizar todo o processo de atendimento, partindo para um modelo "self-service") e de como estas iniciativas infelizmente "tropeçam" em função de más concepções e do fato de que as empresas quase sempre ignorarem o ponto de vista do usuário final da solução. O autor explica que, para muitos usuários, as soluções automatizadas de atendimento são vistas como obstáculos a serem vencidos e que são desenhadas para evitar que o usuário consiga contato com o atendimento humano. Esse desencontro dos anseios dos usuários com as soluções oferecidas é fruto da postura dos provedores dos serviços que, em grande parte, elaboram suas soluções considerando apenas o ponto de vista do negócio e, consequentemente, empobrecendo a experiência do usuário. O autor ressalta ainda que é necessário que os provedores destas soluções conheçam o comportamento dos usuários dentro da solução e que, baseado em dados precisos, redefinam as concepções de modo a eliminar tudo aquilo que não agrega valor e ir ao encontro das necessidades dos usuários com inovações que realmente façam diferença no atendimento.
De fato, muitos provedores de soluções de atendimento desenham os fluxos de seus sistemas com base em seus próprios indicadores operacionais ou ainda de acordo com indicadores que almeja alcançar. Isso é até natural, uma vez que muitas informações fornecidas por contact centers são estáticas (e,portanto, podem ser gravadas), muitos processos são repetitivos e a disponibilidade de atendentes humanos nem sempre é a ideal em cenários de demanda dinâmica. O desafio das organizações está na necessidade de tornar os processos de atendimento mais eficientes com inovação sem prejudicar a experiência dos usuários e, para isso, é necessário conhecer muito bem o perfil dos usuários através de monitorias ostensivas e de relatórios precisos que contenham informações relevantes (tanto para os indicadores operacionais como para mensurar a qualidade da experiência oferecida ao usuário).
Conhecendo bem os usuários finais do serviço, as organizações dificilmente cairão erro de subestimar (oferecendo algo que os usuários enxergarão como simplório) ou superestimar (oferecendo algo que os usuários enxergarão como "complicado" demais) o usuário.
Em muitas outras frentes em que há atendimento ao cliente, estão ganhando cada vez mais força as soluções do tipo “self service” nas quais também é considerada uma vantagem a possibilidade de solucionar um problema, realizar uma compra ou obter uma informação sem que seja necessário interagir com outra pessoa. Estaria o atendimento humano se tornando dispensável?
Desde as grandes operações dos Contact Centers até o atendimento de uma pequena pizzaria, passando também pelos balcões de lojas físicas e agências bancárias, a qualidade do atendimento humano oferecido tem sofrido severas críticas por parte dos clientes que, por sua vez, começam a preferir outras alternativas.
As queixas contra os atendentes variam da falta de preparo para lidar com o público, falta de conhecimento sobre o produto, falta de privacidade (obrigatoriedade de informar ou confirmar dados pessoais), rigidez excessiva (e muitas vezes restritiva) dos procedimentos, imensos cadastros obrigatórios, lentidão e até mesmo a escassez de atendentes que fatalmente resulta em longas filas de espera. Tudo isso contribui para que os clientes tenham uma experiência ruim e, insatisfeitos, passem a evitar esse tipo de atendimento em situações futuras.
Frente aos desafios impostos por essa nova realidade, no mercado de tele-atendimento surgiu o conceito de Context Center, que seria uma evolução do atual Contact Center, dotado de um alcance mais abrangente proporcionado por múltiplos canais de atendimento, de maior flexibilidade nos processos e procedimentos e de informações suficientes para, com base em análises detalhadas, moldar-se ao contexto do cliente. Outro tema muito comentado atualmente é o da humanização do atendimento em soluções como URA, Text to Speech, Speech Analytics, chat, entre outras, para tornar as interações dos clientes com as mesmas mais naturais.
Já para outros ramos de atividade ou empresas de pequeno porte que lidam diretamente com o cliente o cenário ainda é incerto, mas algo precisa ser feito para melhorar o atendimento humano oferecido, antes que o mesmo se torne absolutamente indesejado pelos clientes.
Cabe aqui uma reflexão: onde as empresas em geral pecam para que a situação chegue em um cenário em que muitos clientes preferem o atendimento oferecido por um software, em detrimento do atendimento humano?